Até onde se pode mesmo produzir biocombustíveis sem afetar a produção de alimentos?
O mundo irá mesmo deixar de produzir alimentos para produzir combustível?
A questão é bastante delicada e oportuna no cenário atual de aumento do preço dos alimentos.
O primeiro passo para uma resposta a este questionamento é o da compreensão da relação entre a formação de preço dos alimentos ao consumidor e a produção de biocombustíveis. Vejamos a questão sobre o ponto vista negativo.
1. Os biocombustíveis têm alguma coisa a ver com os alimentos que compramos?
Mais do que poderíamos desejar. No caso do álcool combustível brasileiro, a matéria-prima mais usada para a sua produção é a cana-de-açúcar, a mesma usada na produção de açúcar e seus derivados. O biodiesel utiliza soja, palma (dendê), girassol e amendoim, dentre outras.
2. Aumento da demanda
É verdade que a humanidade está dividindo, hoje, parte de seu alimento com um grande concorrente que é a indústria de biocombustíveis. Pela lei fundamental do capitalismo, o da oferta e procura, como a demanda por produtos que são usados tanto em biocombustíveis como em alimentos em crescimento, os preços, destes, tendem a subir.
3. Diminuição na produção de alimentos
Os agricultores brasileiros, contagiados pela crescente demanda dos biocombustíveis por matéria-prima, têm substituído suas culturas tradicionais pelas utilizadas na produção de biodiesel e etanol. O resultado imediato é a elevação dos preços dos alimentos.
4. Aumento indireto de preços dos alimentos
Boa parte da alimentação dos bovinos, suínos e aves é composta por insumos utilizados na produção de biocombustíveis. Ou seja, poderia ficar mais caro alimentar estes animais. E este aumento nos custo geralmente é repassado aos consumidores - carnes e laticínios podem ficar mais caros.
5. Alguns indicativos do mercado
Ao longo de 2006, o preço internacional do milho (matéria-prima não só da tortilla, mas do etanol nos EUA) subiu 55%. A soja, cuja produção foi reduzida nos EUA para abrir espaço para o milho, teve alta de 13%, segundo o International Food Policy Research Institute (IFPRI).
Na economia brasileira, de 2006 a 2007, alguns alimentos apresentaram elevação dos preços acima do esperado, de acordo com estatísticas da Fundação Getúlio Vargas (FGV). O açúcar refinado, por exemplo, ficou 15,74% mais caro no varejo no período. No período do Pró-álcool, a primeira tentativa de usar etanol nos veículos brasileiros ocorrida nos anos 80, houve muita especulação e os usineiros, às vezes, vendiam para os produtores do etanol e, às vezes, para os produtores de açúcar.
Os especialistas já não ignoram mais a existência de uma correlação entre preços de alimentos e aumento da demanda de biocombustíveis. A constatação veio por meio do informe Perspectivas Agrícolas 2007-2016, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), publicado em setembro de 2007.
De acordo com o relatório, a demanda por biocombustíveis em nível mundial vai duplicar em 10 anos. Do lado da oferta, estima-se que até 2016 a União Européia (UE) irá produzir 21 milhões de toneladas de biocombustíveis, ante aos atuais 10 milhões; os EUA irão dobrar sua produção e o Brasil, por sua vez, irá saltar de 21 para 44 bilhões de litros produzidos anualmente. A China, ainda segundo a OCDE, irá expandir sua produção de etanol em cerca de 3,8 bilhões de litros por ano.
6. Exclusão social
O modelo de produção de biocombustíveis, baseado em grandes propriedades e na geração de sub-empregos, é considerado socialmente excludente.
7. Aumento do efeito estufa
Como o modelo de produção de biocombustiveis usados atualmente ainda se baseiam na utilização dos combustíveis fosseis para o transporte e, no caso americano, até para a produção de etanol, levaram alguns estudos científicos, publicados em outubro de 2007, a apontarem que, se o processo produtivo for considerado na somatória de emissão de gases do efeito estufa, os biocombustíveis chegam a ser 70% mais nocivos do que combustíveis fósseis.
8. Desmatamento de florestas
O aumento da área plantada de cana-de-açúcar poderá pressionar a atual área agropecuária brasileira no sentido da Amazônia e, conseqüentemente, ao desmatamento da floresta.
Um ano após o anúncio do aumento da demanda mundial de biocombustíveis, em 2006, estatísticas apontaram um crescimento no percentual de desmatamento da Amazônia, que há cinco anos seguia tendência de diminuição.
9. Insuficiência de recursos hídricos
Atualmente a quantidade de água utilizada em todo o mundo na produção de alimentos é da ordem de 7 mil metros cúbicos, de acordo com o . A estimativa é que, até o ano 2050, este consumo praticamente dobre. Nas palavras de Jan Lundqvist, diretor do conselhor da SIWI, "as projeções indicam que a água necessária para produzir biocombustíveis crescerá na mesma proporção que a demanda de água por alimentos, o que representaria a necessidade de 20 a 30 milhões de quilômetros cúbicos em 2050. E isto não é possível".
Fonte: How Stuff Works
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